deus primordial
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conhecendo a divindade
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Não há lenda anterior ao seu nome. Ele não surgiu de um pacto, de uma maldição divina ou de um erro dos homens. Ele simplesmente aconteceu — um ponto de ruptura entre o vivo e o morto, uma consciência que recusou a morte antes mesmo que a morte tivesse forma. Adamah não foi criado por outro. Ele foi o primeiro gesto de permanência no mundo, o instante em que a carne recusou o fim e a alma se recusou a partir. Nas profundezas esquecidas de um mundo que ainda aprendia a nomear o tempo, ele se ergueu de uma câmara sem luz. Ao seu redor, jaziam corpos imóveis, mas ele não se sentia parte deles. Estava quente. Estava consciente. E quando abriu os olhos, não era a vida que o olhava de volta — era o vazio. Um vazio faminto, absoluto, perfeito. Mas ao invés de temê-lo, ele o abraçou. E então, como quem desafia o próprio ciclo do mundo, Adamah pronunciou um nome que ninguém havia ensinado.
Adamah descobriu o sangue não como alimento, mas como memória. Ao prová-lo pela primeira vez, compreendeu que o sangue não alimentava o corpo — ele preservava o que a alma deixava escapar. Cada gota era uma história. Cada fluxo, uma lembrança. E ao beber, ele não sentia fome, mas um propósito maior: carregar em si a soma dos que já haviam sido. Não como homenagem. Mas como domínio. Ele se tornava mais com cada vida tomada, não em poder bruto, mas em profundidade. Ao longo dos séculos, surgiram linhagens, nobres, castas e casas ancestrais. Surgiram os que se chamariam de vampiros, os que formariam impérios sob a noite, os que vestiriam mantos escarlates e adornariam tronos de pedra viva. Mas nenhum deles seria original. Nenhum deles carregaria o silêncio da primeira noite. Nenhum deles conheceria o momento em que o mundo ainda não sabia o que era temer a eternidade — até vê-lo caminhar. Adamah não tem corte. Não tem lar fixo. Ele existe onde as vontades morrem e onde os nomes se apagam. Quando um pacto de sangue se rompe, ele sente. Quando um juramento eterno é traído, ele escuta. Ele não castiga, porque não acredita em justiça. Ele apenas lembra. Seu poder não queima, não cega, não grita. Ele pesa. E quando entra em um lugar, a própria memória se curva. Espelhos escurecem. Velas apagam. Vozes hesitam.
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limites da criação
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O Vazio da Fome não é apenas um estado de necessidade — é uma presença viva, antiga e informe que habita o centro do ser dos imortais mais antigos, especialmente daqueles que beberam do sangue não por prazer ou sobrevivência, mas por instinto ancestral de permanência. Esse vazio não começa no estômago, nem na alma. Ele começa na memória, como um buraco negro que se forma onde um nome, uma voz, um gesto deveria ter deixado marca — mas não deixou. Entre os vampiros de Verminia, o Vazio da Fome é mais temido do que a própria morte. Porque a morte é fim. O vazio, continuidade sem sentido. Ele cresce não com a ausência de alimento, mas com a ausência de propósito. Ele se alimenta de silêncio maldito, de pactos esquecidos, de promessas não cumpridas. É um tipo de fome que não busca carne ou sangue, mas presença real — sentir-se inteiro novamente, mesmo sabendo que isso jamais será possível.
Aqueles que mergulham profundamente nesse vazio tornam-se algo além de predadores. Tornam-se poços de perda consciente, entidades que não desejam apenas consumir, mas arrastar tudo ao seu redor para dentro de si — memórias, identidades, convicções, luz. São vampiros que, ao olharem suas presas, não veem corpo, mas lacuna. E ao beberem, não matam: transformam o outro em eco, parte do mesmo vazio que carregam. Adamah, o Vampiro Original, é o ápice desse estado. Ele não sente fome como os outros. Ele é a fome. Sua presença em um lugar é suficiente para que outros vampiros percam o controle, se esqueçam de seus nomes, ou sintam, pela primeira vez, que estão famintos não por sangue, mas por algo que nunca tiveram — e que nunca terão. Aqueles que ousam encará-lo sentem-se secar por dentro, não por medo, mas porque o Vazio da Fome dentro dele reconhece o vazio nos outros, e os chama. Não há saciedade possível. Porque o Vazio da Fome não é ausência de algo. É a lembrança constante de tudo que foi tirado e nunca poderá ser devolvido. E enquanto essa lembrança existir, ele crescerá — devorando, moldando, corrompendo, eternizando. E então, há Adamah. O Vampiro Original. A origem do Vazio. Ele não o carrega. Ele o é. Ele não sente fome. Ele é a fome sentida por todos. Quando um vampiro sente que o sangue já não satisfaz, que os séculos já não pesam, que os rostos se confundem e os dias se repetem, é porque o eco de Adamah tocou sua alma. Ele é o reflexo do que todos temem ser — eternos.
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Passos finais
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Destino Impuro é a sina dos que foram forjados para a grandeza, mas tocados pela ruína antes de chegarem ao trono. É a marca gravada na alma daqueles que nasceram com poder, linhagem, potencial — mas que, em algum momento da eternidade, se desviaram do caminho que o mundo esperava deles. É uma rachadura silenciosa no fio do destino, onde o sagrado encontra o proibido, onde o eterno se contamina com desejo, com falha, com dor. Em Verminia, o Destino Impuro não é falado em voz alta. Ele é temido, como uma profecia não pronunciada, como um nome que todos conhecem mas evitam dizer. Os que carregam essa sina não são fracassados — são grandiosos demais para cair, mas quebrados demais para se manterem íntegros. Vivem entre dois mundos: o da glória prometida e o da ruína inevitável. São lembrados, adorados, temidos. Mas nunca... completamente seguidos. Porque há algo neles que perturba. Algo que não se encaixa. Algo que os condena a serem únicos, solitários, trágicos.
Lady Seraphyne é o reflexo perfeito dessa maldição. Nascida para guardar a palavra, selar pactos e ser o receptáculo sagrado da memória eterna, ela ousou amar um mortal. Por um breve instante, desviou-se de seu caminho ritual, e esse gesto — doce, frágil, humano — contaminou toda a sua eternidade. Agora, embora carregue véus, glória e autoridade, carrega também um peso que nenhuma runa apaga. Um pedaço de mundo que ela jamais deveria ter tocado. E por isso, sua beleza é cruel. Sua presença é divina, mas também… condenada. Vladimir, por mais que reine como juiz absoluto, carrega esse destino na outra face. Ele deveria ter sido um deus perfeito, uma entidade que age sem laço, sem vínculo. Mas a verdade que poucos ousam encarar é que ele ainda sangra por escolhas que jamais pôde desfazer — especialmente o que fez à própria irmã. O poder dele não é puro. Ele reina não porque deseja — mas porque não pode parar. Seu destino é mantido à força, envenenado por cada sentença que grava com uma ponta de arrependimento enterrada sob toneladas de ordem. E então, há aqueles como Adamah, cuja existência é o próprio erro não corrigido do mundo. Ele é o Destino Impuro que não foi desviado, mas nunca deveria ter sido escrito. Ele não se quebrou. Ele nasceu quebrado, e jamais tentou se reconstruir. É por isso que ele permanece: porque ele não precisa lutar contra a falha — ele é a falha feita carne. A rachadura primordial do tempo. O Destino Impuro não é fraqueza. Ele é uma grandiosidade incompleta. Uma eternidade que carrega algo que não deveria carregar — e que, por isso, se torna mais poderosa que os puros. Porque os puros têm limites. Os impuros… não sabem quando parar. Eles são os que amam sem poder amar.